Histórias pra boi dormir




18.10.02
Se eu soubesse mexer em agátêêmeéle, colocaria aquelas caixinhas de comentários no meu blog. Mas como sou um jumento lidando com essas coisas, me conformo com um mero link de e-mail lá em cima, que ninguém vê. Tonho me falou que a galera que visita essas coisas de blog não tem muita paciência de enviar e-mail não, que dá um trabalho danado, carregar outlook etc. Eu também acho, já que nunca enviei uma mensagem pra ninguém via blog. Um ou outro comentário, talvez, mas só quando algo chama realmente a minha atenção. Mas então fiquemos assim: você não fala, eu não falo e a gente fica se desejando anonimamente para sempre. Mas se você perguntar, eu vou responder: sim, eu me sinto isolado!




Não imaginei que o tesão fosse durar tão pouco. Menos de 24 horas, pelos meus cálculos. Anteontem eu comecei, ontem escrevi sedento, hoje nem me lembrei de que o blog existe. Que fracasso!





16.10.02
Só depois que acordo e dou um "reload" nas minhas baterias mentais, percebo o quanto os textos abaixo estavam ansiosos. Eu estava ansioso. Eu e meu texto estávamos ansiosos. É diferente escrever para fora, pros outros. Estou acostumado com meus diálogos internos, minhas confabulações, pirações... tudo dito, discutido e arrotado dentro de mim.

Meu nome é composto. Dizem que pessoas com nomes compostos têm personalidade dupla. Pois é. Eu converso com vários eus e eles me entendem com mais facilidade do que as letras que eu consigo digitar. Engraçado que sempre no período pré-sono eu fico imaginando umas metáforas legais, que poderia colocar aqui e seria interessante, mas quando eu sento em frente à máquina, esqueço de tudo. Será que a tecnologia cega? Vou pensar nisso.

Ontem fui à praia. Lembro da minha sobrinha falando nao-sei-o-quê e das pegadas na areia. Sempre achei pegada algo tão cafona. Pé é um negócio esquisito, né não? Hoje minha inspiração acordou abaixo da linha do horizonte. Só tenho forças pra falar banalidades... melhor ir comer alguma coisa ou alguém...




uma coisa é certa: há um demônio em cada um de nós.





15.10.02
Queria retomar o assunto da casa. Não repare, é que estou muito empolgado com meu novo muquifo. Tipo, o aluguel é barato, o lugar é estranho - estranhíssimo, aliás - e a casa, nossa, parece saída de um filme de terror baba dos anos 70.

É toda em madeira. Na entrada há um jardim morto, retorcido, estéril. Já prometi a mim mesmo cuidar daquilo ali quando tiver um tempo. O teto é repleto de telhas e vigas. Não há forro. As aranhas se multiplicam. As telhas da parte de trás, aliás, quebram com frequência por causa das mangas que caem da mangueira centenária que existe no quintal. Há um tomateiro amontoado perto do muro do vizinho. Ainda dá frutos, apesar de estar quase morto. Há muito cocô de morcego pelas paredes. O rapaz que me alugou o imóvel falou que aquilo tudo pertencia à sua avó, morta em 1996 por uma doença esquisita, da qual não lembro o nome, mas que causava paralisação dos músculos e matava aos poucos. Diz ele que a velha morreu sozinha ali onde é o meu quarto. Eu sou o primeiro morador desde então. Não posso negar que o clima aqui é estranho. Tenho medo em determinadas horas, quando pintam uns barulhos esquisitos, umas vigas rangendo ou uns gatos fazendo farra no meu teto. Mas quer saber? Essa casa é um dos poucos lugares realmente com personalidade que pude encontrar numa cidade tão pequena quanto essa. A vista é bem interessante, já que fica tudo na subida do morro. Vejo passar carros, pessoas, animais... fumo meu cigarro sentado no banco de madeira que tem na varanda. Ligaram meu telefone há poucos dias. Gastei uma grana pra renovar os fios, tubos etc.

Melhor parar de escrever e voltar a conversar com os meus fantasmas. Desconfio de que eles são um tanto impacientes quando não lhes dou atenção. Bom, não se deve brincar com essas coisas, né? Então vou voltar lá pro meu quarto recém-descoberto. Meu tio já foi embora.




Ok, mas vamos ao que interessa então...

Bom, acho que eu deveria colocar um e-mail aqui. Depois vejo isso. Ninguém vai conhecer meu blog hoje mesmo... Ainda há pouco tomei um grande susto ao descobrir que existe mais um cômodo na minha casa recém-alugada. Um espaço enorme, vizinho ao meu quarto. Achei quase sem querer, pois inventei de tatear a parede de madeira em busca de cupins e enfiei o dedo numa fechadura minúscula. Forcei um pouquinho e a porta cedeu. O espaço é maravilhoso, pena que ainda está muito sujo. Tem um balcão grande, que vai de uma parede a outra, cheio de tralhas enferrujadas em cima. Muita poeira, meu Deus, muita poeira. Muito cocô ressecado de cachorro também. Aliás, não sei como os cães conheciam aquele cômodo e eu não. Há uma fresta na parede que dá pra ver a goiabeira da vizinha. Tem um aparelho telefônico no chão, cor de chumbo, modelo bem antiquado. Um escorredor de prato relativamente novo em cima do balcão revela que passou gente por lá há pouco tempo. Há um clima meio estranho sim, quase demoníaco naquele lugar. Pensei que seria ideal para dar festinhas, mas logo vi que as paredes são finas e iria dar mote para os vizinhos reclamarem.

Depois que chequei o lugar, fui fumar no quintal. Meu tio estava deitado numa rede minúscula, estendida entre uma árvore e outra. Ele estava completamente nu e falava algo sem sentido. Ignorei. Fiz uma concha com as mãos para tentar manter o isqueiro aceso e puxei com força a fumaça para dentro de mim. É fantástico sentir o efeito negativo do cigarro dentro dos seus órgãos. Fumar é como andar numa corda fina, pendurada entre dois prédios. Tá, a analogia é fuleira, mas foi inspirada na rede do meu tio, ok? Queria lançar um livro: analogias instantâneas de quintal. Quando meu tio percebe que estou ali, se levanta e vem falar comigo. Ele já está velho, mas conserva ainda uma beleza juvenil, um ar quase moleque, maquiado pelas rugas e cabelos grisalhos. O que obviamente não lhe tira o brilho. Tio sérgio é muito espontâneo com o próprio corpo. A nudez para ele é um mero detalhe.




Talvez um pouco atrasado em relação aos demais, mas nunca é tarde para começar...

... que venha o blog então. Histórias pra Boi Dormir.